sábado, 1 de fevereiro de 2020

REQUIÉM PARA UM SONHO / REQUIEM FOR A DREAM




(2001)

UMA CINTA COMPRESSORA

“Réquiem Para um Sonho” é o segundo longa do Darren Aronofsky. Baseado no livro de mesmo nome  de Hubert Selby Jr., possui como premissa básica o vício e seus desdobramentos. Inicialmente são apresentados de maneira descontraída os personagens Sara Goldfarb, Harry Goldfarb, Marion Silver e Tairone Love.
            Harry (Jared Leto) é amigo de Tairone (Marlon Wayans) e em conjunto com sua namorada Marion (Jennifer Conelly) decidem entrar no mundo do tráfico para bancar os seus sonhos. O filme não se estende no desenvolvimento desses sonhos como meta, mas foca nos caminhos utilizados para alcançá-los. O filme é episódico dividido em três estações do ano, respectivamente, verão, outono e inverno. A escolha dessas estações não são por acaso, pois funcionam como uma boa metáfora para pontuar o ritmo dos acontecimentos.
“Requiem para um Sonho” não é uma obra sobre vício em drogas, especificamente, pois mais do que a toxicomania apresenta ao espectador as diferentes manifestações da compulsão; seja por comida, televisão, sexo e até mesmo uma ideia. A obsessão das personagens é tratada como uma possível solução para os seus problemas, dramas pessoais e fuga da realidade.
Uma marca do filme é o estilo da edição que o diretor denominou Hip Hop montage. Essa consiste em cortes rápidos (nesse foram utilizados mais de 2000) de cenas em alta velocidade combinando sons de maneira quase musicada, o que torna a experiência muito sinestésica e dialoga com a sensação de prazer imediato proporcionada pelo consumo de heroína.
É preciso destacar a trilha sonora do Clint Mansell que ajuda a criar uma atmosfera de suspense e melancolia, lembrada pela faixa “Lux Aeterna”, musica tema do filme.
O elenco está à altura já que o filme, apesar de difícil de digerir, não deixa de ser uma proposta artística e reflexiva sobre um recorte social. Jared Leto e Marlon Wayans transmitem a empolgação acerca de uma nova ideia que promete prosperidade, assim como o senso de constrangimento e melancolia que algumas cenas exigem. Jennifer Conelly interpreta uma moça apaixonada e intensa com uma sensualidade jovial e também não deixa a desejar quando o roteiro lhe direciona para situações de desespero, intimidação e repulsa. Ellen Burstyn no papel de Sara Goldfarb está sem precedentes, sendo convincente ao expressar suas emoções, desespero, fanatismo e desorientação.

ANÁLISE DOS ELEMENTOS (COM SPOILERS)
          Tendo em vista a composição simbólica do filme, vale a pena destrinchar alguns elementos que estão presentes no longa e são responsáveis para a transmissão de muitas mensagens.

AS ESTAÇÕES
        Primeiramente o fato das estações do ano serem utilizadas de forma episódica não é uma escolha aleatória, mas sintoniza com os acontecimentos exibidos. Sendo o verão a primeira delas, a ascensão dos personagens na busca dos seus objetivos é depressa, a edição com cortes apressados e trilha sonora intensa marcam a fase onde euforia e entorpecimento tomavam de conta dos personagens.
        As próximas estações são exatamente a queda do ritmo e das circunstâncias. Como o próprio nome em inglês indica, no outono (fall) tudo começa a desmoronar, e no inverno, que compõe o terceiro ato, é retratado o desconforto e desamparo que um frio extremo pode provocar. Propositalmente a primavera nunca chega, não passando de um sonho.

OS MÉDICOS
Não se pode deixar de reparar a maneira como a sociedade médica foi representada no filme, caracterizada pela impessoalidade e automatismo da profissão.
Quando a personagem Sara precisa fazer uma consulta, a câmera quase nunca foca no rosto do médico. No ambiente hospitalar, essa mesma personagem é manuseada de um lado para o outro, decisões acerca do que será feito com ela são tomadas sem o conhecimento dela nos deixando igualmente perdidos. O diretor “abusa” de planos fechados para mostrar algum material hospitalar sendo utilizado de forma invasiva e até ameaçadora, enquanto a equipe médica parece estar alheia a todas essas sensações.

O TÍTULO
            A palavra “réquiem” vem do latim “requiem” que significa descanso. Era a palavra utilizada para iniciar o ritual nas antigas missas fúnebres típicas da Igreja Católica. “Requiem aeternam dona eis, Domine”, que significa “Senhor, concede-lhes o eterno descanso”.
Dessa forma, o título avisa o que está por vir. De maneira figurada, a mensagem de um sonho morto é adequada, já que o que presenciamos é um retrato da degradação humana que de forma artística e visceral que exibe personagens perdidos e sonhadores em situações extremas.

Um comentário:

  1. Ainda bem que tenho a honra de ser o primeiro a comentar nesse post sobre esse filme em específico, por ser um dos meus prediletos, especialmente pelo título que traduz muito bem o filme. Gostei muito da sua forma simples e direta de resumir bem essa obra-prima, não só com o significado do filme mas tambem com os elementos técnicos. Aposto que isso incentiva pessoas que se interessam pelo tema.

    Está de parabens pela iniciativa!

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