quarta-feira, 8 de abril de 2020

GRAVIDADE


(2013)
SOLITÁRIO

“Gravidade” é uma imersão tanto visual quanto sentimental no espaço. O longa conta a história da Dra. Ray Stone (Sandra Bullock), uma cientista em sua primeira viagem espacial onde, ao lado do colega Matt Kowalski (George Clooney), precisa consertar o telescópio Hubble. A situação sai do controle obrigando-os a enfrentar adversidades em um ambiente incompatível com a sobrevivência humana.
O filme possui uma atmosfera apreensiva já que o ambiente é a própria ameaça. Ao mesmo tempo em que o espaço é o elemento encantador que reflete a grandeza da natureza, também se mostra como um lugar misterioso, imponente e incontrolável.
O diretor, Afonso Cuarón, foi perspicaz em trabalhar uma trama que vai além da ameaça física. O filme explora o sentimento de solidão e inferioridade diante da natureza do espaço, que manifesta leis físicas as quais não estamos habituados e vamos desvendado conforme as vivências da personagem.  A presença da inércia, o silencio e a perda de referência, do que está em cima ou embaixo, tornam-se recursos de suspense que associados a trilha sonora minimalista capturam o espectador com cenas intensas.
Sandra Bullock no papel da protagonista transmite bem o desespero controlado de estar em uma situação onde ela não se sente tão preparada para enfrentar, tanto física como emocionalmente.
Vale ressaltar como os movimentos de câmera lenta e ritmada auxiliam a criar a sensação da falta de gravidade. O diretor também se utiliza de diversos enquadramentos, pondo a câmera em primeira pessoa e ressaltando a respiração da personagem, depois abrindo para um plano geral onde pega todo cenário, tudo de maneira fluida e variando de acordo com o ritmo da trama.
Gravidade é uma obra esteticamente impecável com uma personagem forte que vive uma “experiência inesquecível”.

ANÁLISE DE ANALOGIA (COM SPOILERS)
Nas entrelinhas da narrativa declarada, “Gravidade” sugere uma bela analogia ao renascimento, ao gesto de recomeçar. Não é a toa que a imagem de Ray na nave lembra um bebê no ventre. Aquele é o momento em que ela se viu temporariamente livre do perigo, onde pôde finalmente relaxar e se sentir guardada.
Finalmente chega a cena onde o conceito de Freud sobre “Pulsão de morte” se faz presente. Ele a define como uma força que tende a volta para o estado inanimado, é o desejo inconsciente de apagar, adormecer, deixar de existir.
Essas sensações são representadas no terceiro ato do filme, onde Ray se vê completamente isolada de comunicação e literalmente apaga os sistemas motores que a mantém viva, já que até então tudo se resumia a sobreviver.
“Eu saio do trabalho e apenas dirijo, é isso que eu tenho feito”, é assim que Ray descreve sua vida. Somente após a aparição enérgica do Matt, ela decide despertar, acender as luzes, aumentar o nível de oxigênio, movimentar-se para além do medo e despedir-se como pode da filha que já se foi.
É uma bela cena onde a personagem ressignifica a sua perda e decide agir. Tamanho é o seu ímpeto de vida que nem mesmo a morte importa, melhor é atravessar, tentar até a ultima possibilidade, para despencar incandescente em pleno oceano e romper a cápsula tal qual um segundo nascimento. Um nascimento para si própria.

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